No último sábado (23/07), a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a Varíola dos macacos como uma emergência de saúde pública internacional, também conhecida pela sigla ESPII”, atingindo assim o mais alto nível de alerta entre os países membros da OMS.
Apesar da doença apresentar baixa letalidade na maioria dos casos, o quadro clínico pode ser exuberante, resultando assim em uma grande procura da população pelo atendimento em serviços de saúde.
O ministério da saúde desenvolveu então uma nota técnica com orientações para as equipes da Atenção Primária à Saúde (APS), a fim de unificar o fluxo de atendimentos destes casos. Confira abaixo os destaques da nota, e bons estudos!
Contextualização
A doença Monkeypox (MPX) é classificada como endêmica em países da África Central e Ocidental, e no ano de 2022 foi confirmada em diversos países não africanos. A possibilidade de um surto mundial da MPX alertou as autoridades sanitárias em todo o mundo e chamou a atenção para a necessidade de ações precoces que evitem a disseminação da doença.
A MPX é uma doença causada pelo vírus Monkeypox (MPXV) do gênero Orthopoxvirus e família Poxviridae. Trata-se de uma doença zoonótica viral, cuja transmissão para humanos pode ocorrer por meio do contato com animal ou humano infectado ou com material corporal humano contendo o vírus. Apesar do nome, os primatas não humanos não são reservatórios.
Para evitar que haja um estigma e ações contra os primatas não humanos optou-se por não denominar a doença no Brasil como varíola dos macacos. O reservatório natural ainda está sendo investigado, principalmente os pequenos roedores. Assim, apesar do estrangeirismo, uma tentativa de solucionar a situação foi a de usar a denominação dada pela OMS, Monkeypox, evitando ações contra os animais.
Características clínicas da monkeypox
A MPX é geralmente uma doença autolimitada, cujos sinais e sintomas duram de 2 a 4 semanas. O período de incubação é tipicamente de 6 a 16 dias, mas pode chegar a 21 dias. A pessoa infectada é assintomática no período de incubação.
Os sinais e sintomas iniciais clássicos incluem febre súbita, dor de cabeça, dores musculares, dores nas costas, adenomegalia, calafrios e exaustão. A detecção de linfadenopatia é uma característica clínica importante, auxiliando no diagnóstico diferencial entre MPX e outras doenças.
A manifestação cutânea ocorre entre um e três dias após os sinais e sintomas iniciais. A erupção cutânea da MPX passa por diferentes estágios: mácula, pápula, vesícula, pústula e crostas. Inicialmente, as lesões têm diâmetro entre meio centímetro e um centímetro, e podem ser confundidas pelas causadas por varicela ou sífilis, e a principal diferença é a evolução uniforme das lesões na MPX
Os casos de MPX descritos no surto atual apresentam algumas características atípicas. A erupção pode começar nas áreas genital e perianal, a erupção nem sempre se dissemina para outras partes do corpo e os sintomas prodrômicos podem ser leves ou ausentes. Essas características dos casos mais recentes de MPX podem ser facilmente confundidas com infecções sexualmente transmissíveis (IST).
É importante avaliar de forma abrangente os pacientes que apresentam úlceras genitais ou perianais para ISTs. No entanto, coinfecções com MPX e ISTs foram relatadas e a presença de uma IST não exclui MPX. Pacientes com uma nova erupção característica ou que preencham um ou mais dos critérios epidemiológicos definidos no conceito de caso suspeito devem ser testados para MPXV. Ainda que não tenham sido até o momento registradas mortes por este vírus neste surto, nos países onde a MPX é endêmica a mortalidade varia entre 1% e 10%.
A transmissão entre humanos ocorre principalmente por meio de contato pessoal com secreções respiratórias, lesões de pele de pessoas infectadas ou objetos contaminados. A transmissão via gotículas respiratórias usualmente requer contato próximo e prolongado com o paciente infectado. O vírus também pode infectar as pessoas por meio de fluidos corporais. O período de transmissibilidade é encerrado quando o paciente não apresenta mais crostas, e a pele encontra-se cicatrizada.
Definição do caso
Caso suspeito: Indivíduo de qualquer idade que, a partir de 15 de março de 2022, apresente início súbito de erupção cutânea aguda sugestiva de Monkeypox, única ou múltipla, em qualquer parte do corpo (incluindo região genital), associada ou não a adenomegalia ou relato de febre. E um dos seguintes vínculos:
1. Ter vínculo epidemiológico com casos suspeitos, prováveis ou confirmados de Monkeypox, desde 15 de março de 2022, nos 21 dias anteriores ao início dos sinais e sintomas.
2. Histórico de contato íntimo com desconhecido/a(s) e/ou parceiro/a(s) casual(is), nos últimos 21 dias que antecederam o início dos sinais e sintomas.
3. Histórico de viagem a país endêmico ou com casos confirmados de Monkeypox nos 21 dias anteriores ao início dos sintomas.
4. Ter vínculo epidemiológico com pessoas com histórico de viagem a país endêmico ou país com casos confirmados de Monkeypox, desde 15 de março de 2022, nos 21 dias anteriores ao início dos sinais e sintomas.
Caso confirmado: Indivíduo que atende à definição de caso suspeito com resultado/laudo de exame laboratorial “Positivo/Detectável” para Monkeypox vírus (MPXV) por diagnóstico molecular (PCR em Tempo Real e/ou Sequenciamento).
Assistência inicial a saúde
O atendimento inicial deve ser realizado, preferencialmente, nas Unidades Básica de Saúde (UBS) da Atenção Primária, indicando-se internação hospitalar para casos que apresentem sinais de gravidade. Os pacientes que fazem parte do grupo de risco devem ser analisados caso a caso em relação à indicação de internação.
A anamnese e o exame físico são fundamentais para diferenciar MPX de outras doenças, conforme a definição de caso suspeito. Apresentando os critérios para um caso suspeito de MPX, o paciente deve ser mantido isolado (precauções para contato com lesões e gotículas. As lesões de pele em áreas expostas devem ser protegidas por lençol, vestimentas ou avental com mangas longas.
A notificação à vigilância epidemiológica deve ser imediata. Exames laboratoriais devem ser solicitados pela equipe assistencial.
A condução do caso vai depender da presença ou ausência de sinais de gravidade. Caso presente um ou mais critérios, recomenda-se internação em hospital de referência, de acordo com a pactuação no território.
Critérios clínicos de gravidade:
- Score de severidade de lesão cutânea grave (100 – 250 lesões) ou muito grave (mais de 250 lesões)
- Insuficiência respiratória
- Sepse
- Confusão
- Hepatomegalia
- Adenomegalia cervical com disfagia
- Desidratação
A condução do caso para a população de risco sem sinais de gravidade, incluindo o local de isolamento desta população, deverá ser analisada caso a caso. Em situações nas quais as condições sociais ou geográficas dificultem o isolamento domiciliar, recomenda-se acomodação em estabelecimento de referência, hospitalar ou não, de acordo com a pactuação no território.
Em relação aos pacientes com bom estado geral, que não fazem parte da população de risco, recomenda-se que seja prescrito tratamento sintomático. O paciente deve permanecer isolado, preferencialmente em ambiente domiciliar, até a liberação dos resultados laboratoriais, momento no qual o paciente será reavaliado e reorientado quanto ao tratamento, e a continuidade ou não do isolamento e do monitoramento dos contatos.
Coleta das amostras
Exames confirmatórios:
Material vesicular (Secreção de Vesícula): O ideal é a coleta na fase aguda são as vesículas ou as pústulas. É quando se obtém carga viral mais elevada na lesão. Portanto, o swab do conteúdo da lesão é o material mais indicado. Também pode-se puncionar com seringa o conteúdo da lesão. Havendo lesões na cavidade bucal, pode-se recolher material das lesões com swab.
Crosta (Crosta de Lesão): Quando o paciente é encaminhado em fase mais tardia, o material a ser coletado são as crostas das lesões.
Exames para diagnóstico diferencial:
Sangue total: Coletar 10 ml em adultos e 5ml em crianças para todos os casos suspeitos (herpes simplex 1 e 2, teste rápido para sífilis). As equipes assistenciais podem solicitar outros exames, a depender do quadro clínico do paciente.
Avaliação dos exames laboratoriais
Os pacientes considerados como suspeitos para MPX deverão ser reavaliados após a liberação dos resultados laboratoriais confirmatórios e diferenciais. Se houver confirmação laboratorial para o vírus da MPX por teste molecular (qPCR e/ou sequenciamento), o caso é considerado confirmado para MPX. A conduta recomendada é a manutenção do isolamento até desaparecimento das crostas e a pele encontra-se cicatrizada, e o monitoramento dos contatos a cada 24h, observando o aparecimento de sinais e sintomas de MPX, por um período de 21 dias, desde o último contato com o paciente, com aferição de temperatura duas vezes ao dia, realizada pelo paciente ou familiar e comunicado à equipe de saúde da Atenção Primária. Não há necessidade de isolamento dos contatos assintomáticos.
Se o resultado do exame for não detectável para MPX o caso é considerado como descartado para MPX, exceto em caso de persistência de quadro clínico sugestivo de MPX, sem diagnóstico diferencial. Neste caso, a equipe assistencial poderá solicitar nova coleta de exames laboratoriais confirmatórios, com a maior brevidade possível, caso ainda estejam presentes lesões cutâneas.
Tratamento medicamentoso
Os antivirais utilizados para tratamento de MPX no mundo, até o presente momento, não estão disponíveis no Brasil. Neste sentindo, o tratamento da MPX é sintomático, com o objetivo de aliviar sintomas, prevenir e tratar complicações, além de medidas preventivas e de vigilância
Medicamentos podem ser utilizados em caso de dor ou febre:
- 1ª opção: Dipirona (solução gotas 500mg/ml ou 500mg/cp) em caso de dor ou febre, de 6/6 horas.
- Crianças: > 3 meses: (lactentes 10 mg/kg/dose; pré-escolares: 15 mg/kg/dose)
- Adultos: 500-1000 mg VO (dose máxima no adulto 4 gramas)
- 2ª opção: Paracetamol (200 mg/ml ou 500mg/cp), a cada 4/4 horas ou 6/6 horas a depender da frequência de febre ou dor.
- Crianças: 10-15 mg/kg/dose (máximo de 5 doses ao dia)
- Adultos: 500-1000 mg/dose (máximo de 3mg/dia)
* Para casos mais severos, uso de opioides pode ser necessário.
Cuidados com as lesões cutâneas
As lesões cutâneas devem ser cobertas o máximo possível (por exemplo, camisas de mangas compridas, calças compridas, etc), e devem ser trocadas quando úmidas, para minimizar o risco de contato com outras pessoas. Deve-se evitar tocar nas feridas e levar as mãos à boca e/ou aos olhos. Vesículas não devem ser rompidas.
A higienização da pele e das lesões podem ser realizadas com água e sabão. Utilizar curativo para proteger a área, caso seja orientado pela equipe de assistência à saúde. As infecções bacterianas secundárias devem ser tratadas conforme indicado pela equipe de assistência em saúde.
Orientações para o isolamento domiciliar
- Precauções gerais: Evitar o contato com as secreções do paciente e em caso de necessidade de manejo, usar luvas descartáveis sempre que possível. Na indisponibilidade de luvas descartáveis, lavar as mãos com água e sabão ou utilizar álcool 70%.
- Lavar as mãos com água e sabão, dando preferência ao papel-toalha para secá-las. Caso não seja possível, utilizar toalha de tecido e trocá-la toda vez que ficar úmida.
- Limpar frequentemente (mais de uma vez por dia) as superfícies que são frequentemente tocadas com solução contendo água sanitária, incluindo o banheiro.
- Roupas pessoais, roupas de cama e roupas de banho do paciente não devem ser sacudidas e nem reutilizadas por outras pessoas. Devem ser lavadas separadamente, com sabão comum e água entre 60 e 90°C. Na indisponibilidade de água aquecida, pode ser utilizada solução contendo água sanitária.
- Não compartilhar o uso de talheres, os quais, devem ser lavados com água entre 60-90°C e sabão comum. Na indisponibilidade de água aquecida, pode ser utilizada solução contendo água sanitária.
- Conter e descartar os resíduos contaminados (como máscaras, curativos e bandagens) de forma adequada, conforme orientação das autoridades sanitárias (federal, estaduais, distrital ou municipais) podendo-se seguir para a MPX o já preconizado pelos territórios em relação à covid-19.
- Quando for descartar o lixo do paciente, utilizar sempre que possível, luvas descartáveis.
- Não descartar os resíduos infectantes/contaminados em lixo comum do domicílio, aterros ou lixões.
Para conferir o material na íntegra, clique aqui. *É importante ressaltar que, conforme novas evidências forem sendo discutidas e apresentadas, novas versões dessa nota informativa serão disponibilizadas.
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